sexta-feira, 19 de julho de 2013

Projeto ‘Cale-se’ resgata memória sobre Ditadura

Sob a coordenação do professor João Batista de Abreu, projeto de extensão "Afasta de mim esse cale-se" resgata história de pessoas perseguidas pela Ditadura Militar e aborda discussões ligadas ao tema Direitos Humanos nos dias atuais. Iniciativa foi retomada no ano passado e prevê nos próximos meses a produção de reportagens e entrevistas sobre os 50 anos do Golpe Militar de 1964.

Mayara Azevedo

Construir a história. Essa é a proposta do Projeto de Extensão do Departamento de Comunicação Social da UFF “Afasta de mim esse cale-se”. Iniciado em 2004, o projeto, que começou com o intuito de publicar depoimentos de pessoas anônimas que viveram no período de ditadura, hoje aborda várias discussões ligadas às transgressões dos Direitos Humanos.

Sob a coordenação do professor João Batista de Abreu, o projeto possui um livro homônimo, lançado em 2006. O livro, publicado na fase inicial do projeto, reúne entrevistas de pessoas desconhecidas do grande público que sofreram as consequências da ditadura. Depois da publicação, João Batista viu que o tema poderia abranger muitas outras áreas. “Achei que seria uma coisa muito temporal, muito específica, e de certo modo falaciosa pensar que nós tínhamos uma ditadura militar e, depois da democratização, o mundo voltou à realidade. Claro que uma coisa não é igual à outra, mas você ainda tem abuso de autoridade e eu acho que a gente também tem denunciar isso”, relata o professor.

Para aumentar a abrangência e abordar outros assuntos ligados aos Direitos Humanos, o projeto possui um site que reúne a produção de alunos e bolsistas, além de reproduzir notícias de outros meios de comunicação e contar com a publicação de colaboradores. 

Atualmente, com as manifestações que tomaram o Brasil, ele reúne um vasto conteúdo sobre essas passeatas a partir diversos pontos de vista, especialmente de alunos, professores e da mídia alternativa. A escolha e publicação dos conteúdos são administradas pelos atuais bolsistas do projeto, Rebeca Letieri e João Pedro Passos. “Ele (o projeto) tem super a ver com o que tá rolando. Comecei a ver muita gente publicando textos maravilhosos no facebook, relatos, depoimentos, fotos. Só que eu achava que aquilo se perdia com o tempo. O site tem a proposta de documentar aquilo, construir memória. Então começamos a sugerir que essas pessoas que estavam escrevendo para o facebook escrevessem para o site” relata Rebeca.

Dessas parcerias, foi criada por João Batista a seção “Impressões de Viagem”, que possui relatos de pessoas que não moram na Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Os relatos internacionais das manifestações em Portugal em apoio às brasileiras, da situação da Turquia, além da própria cobertura dos eventos no Brasil renderam ao site um feedback internacional de países como Portugal, França e Itália. “Essa visibilidade lá de fora é muito legal, por mais que a gente saiba que talvez sejam brasileiros que estão lá, mas ainda assim é interessante porque significa que está circulando bastante”, constata Rebeca.

O início

A inspiração para o projeto começou a partir de uma entrevista do então candidato à Presidência da República Enéas Carneiro, como explica João Batista, coordenador do projeto. “Ele disse que a ditadura só atingiu os políticos e os artistas, que a população não foi atingida por ela. Bem na linha da Folha de São Paulo, da ‘ditabranda’. E isso não é verdade, mas uma mentira deslavada.” Buscando mostrar o contrário, o professor da disciplina Técnicas de Reportagens propôs aos alunos que entrevistassem pessoas que tivessem sofrido algum tipo de perseguição neste período. 

O resultado dos textos e das pesquisas dos alunos, que não viveram essa época, foi tão intenso que surgiu a ideia, por parte das alunas, na época, Maria Lúcia Muniz e Renata Cunha de reunir os textos em um livro “Estava super envolvida com o tema da ditadura militar e abracei a ideia de juntar os trabalhos em uma publicação”, conta Maria Lúcia, que, além da Comunicação, cursava, em outra instituição, a faculdade de História. O livro, homônimo ao projeto, foi lançado pela Editora UFF, com o apoio da Pró-Reitoria de Graduação (Prograd), antiga Proac.  

Depois da publicação do livro, as alunas aprofundaram ainda mais a pesquisa e sugeriram a criação do projeto de extensão. “Depois que imprimimos e lançamos o livro, veio a ideia de ampliar a proposta e fazer um projeto de extensão que abordasse as questões de direitos humanos”, lembra Maria Lúcia. João Batista na época era vice-diretor do Instituto de Arte e Comunicação Social (IACS) e por isso indicou o também professor de Comunicação Alceste Pinheiro para encaminhar o projeto, assumindo a sua coordenação quando deixou o cargo na direção.

O recomeço

Com dificuldades para encontrar bolsistas e com João Batista sem tempo para se dedicar sozinho ao projeto, o Cale-se ficou inativo a partir de 2011. Em 2012, o projeto Jovens Talentos, que destina bolsas para calouros, selecionou Rebeca e João Pedro, que poderiam escolher participar de um projeto de extensão ou de uma pesquisa de iniciação cientifica.

Apresentados ao Cale-se pela professora Sylvia Moretzsohn, os alunos se identificaram com o projeto e decidiram retomá-lo com João Batista. “Sempre gostei de História e isso me chamou atenção, não só por esse gosto, mas pela relação com função do jornalista. De certa forma, é um jeito da gente não só estudar História, mas fazer história”, conta Rebeca.

No segundo semestre de 2012, eles criaram um novo site para o projeto. “Era um programador voluntário do projeto que mexia no site antigo. Eu e João Pedro não sabíamos mexer. Além disso, ele tinha uma estética visual meio ultrapassada. Então sugeri para o João Batista que a gente criasse um novo site e ‘linkasse’ o site antigo para dar uma nova cara”. Na reformulação, o site reproduziu as matérias antigas e ganhou novas seções. No entanto, devido à greve no ano passado, os novos conteúdos que começavam a ser produzidos não foram publicados. O projeto foi retomado oficialmente em 2013, com a publicação das entrevistas feitas pelos bolsistas. 

Print Screen do Site

Para o futuro do projeto, João Batista prevê a publicação de um novo livro com os relatos das manifestações, com o título provisório de “Não se cale”. Além disso, está previsto para o ano que vem um pacote especial de reportagens e entrevistas sobre os 50 anos da ditadura. 

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